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O “Poweringrismo”: Uma nova forma de preconceito!

São tantas as formas de preconceito que a gente nem faz ideia, por isso cuidado! Você pode estar cometendo essa nova forma de preconceito e nem sabe.

O “Poweringrismo”: Uma nova forma de preconceito!

O “Poweringrismo”: Uma nova forma de preconceito!

Várias são as denominações para falar do preconceito contra as pessoas “velhas”. E, eu, confesso, só me dei conta de que havia tantas definições depois que minha curiosidade ficou aguçada por um vídeo (impecável, diga-se de passagem) da influencer, escritora e publicitaria mineira, Cris Guerra.

Em seu vídeo publicado nas suas redes sociais, Cris Guerra expressa seu incômodo com um quadro do programa Porta dos fundos, protagonizado pelo ator e humorista, Flavio Porchat, duas atrizes, Evelyn Castro, Noemia Oliveira, e a voz da mãe que aparece ao fundo do ator, Joel Vieira. O texto e a fala da Cris são tão belos que sinto como se ela escrevesse com o mesmo talento e firmeza das mais brilhantes cirurgiãs plásticas que usam seus bisturis com tamanha precisão, incapazes de deixar qualquer cicatriz.

Claro que fui assistir ao episódio intitulado “Responsável” do qual a Cris trouxe à tona o tema “etarismo” para entender um pouco mais a abordagem do programa. Fiquei igualmente incomodada e, se pudesse usar um adjetivo não tão elegante quanto os que a Cris usou no seu texto impecável, eu usaria deplorável. Achei o texto extremamente infeliz e fiquei sem entender se houve alguma outra intenção que não fosse a de transformar uma mulher de 57 anos num ser incapaz, com uma certa demência (que não cabe dizer senil) cujo filho diz: “eu sei como criar a minha mãe.”

Fazendo uma leitura do cenário e dos personagens, pude concluir que essa mulher de 57 anos deva ser branca, de classe média, hetero e mãe de um filho nos seus 40 que ou mora com a mãe ainda solteiro ou cuja mãe mora com ele.

Pesquisando mais sobre o tema, fui levada a fazer algumas reflexões sobre essa enxurrada de novas palavras incorporadas ao português. Muitas delas, ainda em inglês, tratam das questões de todos os tipos de preconceitos, não apenas contra as pessoas velhas.

Nesta lista estão palavras sinônimas: etarismo, idadismo, idosismo, ageismo (termo do inglês ageism, criado pelo psiquiatra americano, Robert Butler, em 1969, com base na palavra age (idade em inglês) e todas descrevem o preconceito que a sociedade tem contra pessoas mais velhas).

Passeando no vocabulário de preconceitos contra a mulher, além do machismo e da misoginia (nossos conhecidos de muitos anos) se somam outros tantos também em inglês com algumas traduções não comuns e meio estranhas para o português como:

MANTERRUPTING – quando o homem interrompe a mulher, de maneira desnecessária, incisiva, persistente e não permite que ela expresse sua linha de raciocínio e concluir sua frase. Em português, seria algo do tipo (“ominterrupção”)

BROPRIATING – quando o homem se apropria, toma para si, a mesma ideia já expressada ou realizada por uma mulher. (“omipropriação”)

MANSPLAINING – quando um homem trata a mulher como incapaz cognitivamente de entender o que é obvio dando a ela um tratamento inferior. (“omiexplicação”)

GASLIGHTING  – quando numa conversa o homem inverte as coisa e chega a afirmar que a mulher está louca, desequilibrada, incapaz, fazendo com que ela se cale e se sinta muito mal. (“omipulação”)

Somam-se à lista de preconceitos, todas aquelas expressões, piadas, vocábulos, que nos são conhecidos a pelo menos cinco séculos aqui extremamente violentas e sexistas contra o grupo os negros, os LGBTs, grupos étnicos e/ou regionais como contra nordestinos, índios, ciganos e por ai vai, inclusive o preconceito contra as pessoas pobres e jovens.

O Brasil é, na verdade, um país adoecido pelo preconceito.

Sob essa perspectiva, chego a uma conclusão óbvia, (já retratada por vários sociólogos): só estão livres de preconceitos os homens, heteros, brancos, adultos e bem sucedidos, que, não por acaso, são os que mais os praticam.

Sou uma mulher, hetero, branca, de classe média (talvez até alta pelos padrões brasileiros), de 54 anos. Sou pós-graduada com algumas formações acadêmicas e não acadêmicas, o que me coloca no rol das pessoas privilegiadas deste país. Na minha vida, fui poupada de vários preconceitos, obviamente. E, claro, sofri na pele agressões como sofrem mulheres negras heteros, pobres e homossexuais.

Se sofri algum preconceito foi por frequentar ambientes nos quais o lugar da mulher era sempre visto como menor, menos significativo em espaços meramente masculino. Uma experiência que tive foi numa Associação na qual as questões da mulher são tratadas sempre como secundárias (quando não, vistas como fúteis). Funcionam como câmara, ou seja, um apêndice, totalmente dependente de uma instituição com estrutura machista e patriarcal. A qual nenhum presidente até hoje tenha sido uma mulher. Onde o quadro de diretoria é majoritariamente (chega em algumas gestões a mais de 90%) de homens. Os eventos das mulheres ou para mulheres eram sempre em salas menores. Embora as mulheres sejam 51% da população e o orçamento praticamente inexistente.

Uma outra situação que sofri preconceito foi na minha adolescência.

Sempre fui muito comunicativa e gostava de estar entre adultos. Além disso, era muito dona das minhas ideias e “verdades”. Lembro-me já com 16/17 anos e até um pouco mais velha, não adolescente mais, mas jovem. Meu pai e outros homens, muitas vezes, dizerem que aquele determinado assunto não era para mim. Ou de não dar o menor valor e atenção para alguma ideia minha, por melhor que ela fosse.

Lembro-me também de uma situação que me marcou muito quando fiz um curso de férias na minha escola de inglês. Como era muito boa aluna e adorava o idioma, eu me destacava e já não tinha mais curso para a minha idade porque estava avançada. Nesta turma, só tinham “adultos” e havia um rapaz, talvez uns 5/7 anos mais velho que eu, que me tratava como uma imbecil.

Por outro lado, todas essas reflexões feitas ao escrever este artigo me levaram a um lugar que eu não gostaria de revisitar. Levaram-me ao lugar da minha própria escuridão. Aos relatar nessas linhas meus incômodos, fiquei me lembrando quantas vezes eu mesmo não pratiquei preconceitos e violências. Quando me lembro de mim há 20, 30, 40 anos, muito mais jovem e muito menos consciente, vejo uma mulher que foi, em vários momentos, arrogante, prepotente, agressiva….

Posso dizer que eu já tive os meus anos de “Diabo veste prata”.

Quantas vezes, eu mesma não permiti que o outro falasse ou concluísse sua fala? Se pratiquei “mansrupting”? Não, porque não sou homem. Mas, com certeza, já pratiquei “powerrupting” (palavra que acabei de inventar). Devo também já ter praticado “powerplaining”, “powerpropriation”, “gaslighting” quando me sentia em lugar de mais poder do que o(a) outro(a).

Como disse o próprio Flavio Porchart e a Cris Guerra, eu também sou uma pessoa que estou descontruindo meus preconceitos. E desenvolvendo enormemente minha empatia tentando o tempo todo me imaginar no lugar do outro. No momento que me senti tocada em relação às dores dos velhos, refleti sobre os preconceitos que os jovens sofrem e sempre sofreram. Geração após geração, os estereótipos são sempre de que são inconsequentes, imaturos, irresponsáveis, mimados,…e por aí vai.

O Brasil avançou, em alguns momentos, com os estatutos da criança e dos idosos, com as leis de políticas afirmativas. Além disso, com as leis Maria da Penha, do feminicídio e de proteção a mulher, com as leis de inclusão dos deficientes físicos. Entretanto, a prática, seja nos espaços públicos ou nas instituições privadas, precisa ser uma prática de menos opressão, menos polarização e de menos preciosismo.

O Brasil considera velhas ou idosas as pessoas com mais de 60 anos desde 2013 com a publicação do estatuto do idoso. Embora a própria OMS e a ONU não tenham mudado essa classificação (foi uma fake News). Uma vez que essas instituições sequer classificam as pessoas como idosas com o ponto de corte de idade de 60 anos. Elas entendem que cada país e região devem decidir essa classificação porque as realidades são muito adversas.
(https://g1.globo.com/fato-ou-fake/coronavirus/noticia/2020/06/09/e-fake-que-oms-mudou-classificacao-de-idoso-para-pessoa-com-80-anos-ou-mais.ghtml)

E é exatamente esse o ponto que me faz chegar até aqui.

Quando vejo práticas de preconceito e, ainda pior, de violência contra pessoas acima de 60 anos sinto-me muita dor por isso, claro. Contudo, devemos pensar que o preconceito no Brasil também não é democrático. Em outras palavras, a desigualdade socioeconômica não faz com que todos sofram da mesma forma.

A personagem do Responsável é uma mulher de 57 anos, portanto não se enquadra nem classificação de idosa no Brasil.  Se você, como ela, só sofreu preconceito pela primeira vez quando próxima dos 60 anos é porque deve ser uma pessoa muito privilegiada.

Não estou em momento algum desmerecendo o que vários estudiosos e simpáticos ao etarismo, ageísmo, idadismo ou idosismo defendem. Mas acredito ser imensamente importante desenvolvermos uma mentalidade mais crítica e mais empática. Entender que o etarismo sentido por uma pessoa branca, hetero, classe média não será jamais, nem de perto, igual a todos os preconceitos que os que não se enquadram nessa classificação sofrem. E, muitas delas, desde o dia que nascem…isso é, quando nascem.

O etarismo para os negros e negras (crianças, jovens e mulheres, principalmente), pobres, homossexuais, deficientes físicos, índios… é algo que muitos não vão experimentar. Isso porque não terão a sorte sequer de chegarem aos 60 anos. E, se chegarem, já estarão tão machucados e cheios das cicatrizes dos inúmeros outros preconceitos que já viveram que, de verdade, não vão sentir a dor de serem chamados de velhos, de terem rugas nos rostos ou cabelos brancos na cabeça.

Só para lembrarmos de um único dado entre os inúmeros que há no Brasil ligados aos crimes de racismo, feminicídio, etc:

“Em média, 100 a cada 100 mil jovens com idade entre 19 e 26 anos morreram de forma violenta no Brasil em 2012, mostra o Mapa da Violência 2014, que considera morte violenta a resultante de homicídios, suicídios ou acidentes de transporte”
(https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2014-07/p-quarta-jovem-homem-negro-esse-e-o-perfil-dos-que-mais-morrem-de-forma-viol)

O que isso tem a ver com empreendedorismo e com empresas? A meu ver, tudo. Se queremos viver numa sociedade mais justa, se queremos exercer a equidade, se queremos espaços para todos, convido a olharmos para cada pessoa como SER HUMANO. Que tal deixarmos de praticar os “POWERINGRISMOS*”, ou seja, as relações de poder e opressão? Que tal começarmos com o exemplo dentro das empresas? Desde a contração de pessoas cada vez mais diferentes até a promoção de políticas de mais inclusão, equidade, respeito e diversidade?

(*) poweringrismo – palavra que não existe em português e acabei de inventar.

Gostou do artigo? Quer saber mais sobre essa forma de preconceito e como combatê-la? Então entre em contato comigo. Terei o maior prazer em responder.

Cris Ferreira
https://soucrisferreira.com.br/

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Cristiane Ferreira é Coach formada pelo IBC – Instituto Brasileiro de Coaching, Professora da Fundação Getúlio Vargas com cadeiras em Liderança, Coaching, Inteligência Emocional, Técnicas de Comunicação e Empreendedorismo, Palestrante, Empresária do setor de Educação desde 1991, Graduada em Letras pela UFMG e Pós-graduada em Linguística Aplicada pela UFMG, MBA em Gestão de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas, Formada em Inglês pela University of New Mexico, EUA, Apresentadora do Programa Sou Múltipla, Fundadora da Associação das Mulheres Empreendedoras de Betim, Ex-Presidente da Câmara Estadual da Mulher Empreendedora da Federaminas (2014/2016), Destaque no Empreendedorismo feminino, recebeu vários prêmios entre eles o “Mulheres Notáveis – Troféu Maria Elvira Salles Ferreira” da ACMinas, troféu Mulher Líder, “Medalha Josefina Bento” da Câmara Municipal de Betim, “Mulher Influente” do MG Turismo e o “Mérito Legislativo do Estado de Minas Gerais”, Comenda Amiga da Cultura da Prefeitura Municipal de Betim.
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