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Mães exaustas têm algo para comemorar no Dia das Mães?

Será que há realmente o que comemorar no Dia das Mães? Entenda como a cultura patriarcal transforma a celebração em um dia exaustivo e invisível para muitas mulheres. Uma análise profunda e urgente sobre opressão e privilégios.

Mães exaustas têm algo para comemorar no Dia das Mães?

Patriarcado: Mães exaustas têm algo para comemorar no Dia das Mães?

Segundo domingo de maio, casa cheia e família reunida para “comemorar” o dia das mães. Minha avó, que já tinha começado a preparar o lombo no dia anterior, acordou cedo para garantir que a casa estaria impecavelmente limpa e organizada (como sempre estava) na hora que filhos, noras, genros e netos chegassem.

O cardápio seria o de sempre: macarronada, tutu mineiro, lombo, couve, ovos cozidos e, de sobremesa, marrom glacê em lata e doce de figo que ela mesma já tinha feito há alguns dias. Bebida alcoólica só tinha porque meu pai levava, mas meus avós não gostavam e não bebiam. Vovó, nessas datas especiais, comprava Mate Couro, refrigerante que ela passou a ter sempre na geladeira quando ficou bem mais velha e o dinheirinho da aposentadoria permitia que comprasse.


O ritual era sempre o mesmo…


Os homens se juntavam na sala para conversar, tomar sua cerveja ou assistir futebol. Enquanto isso, as mulheres se dirigiam para a cozinha para ajudar a finalizar o almoço, colocar a mesa e garantir que todos seriam servidos. Elas também asseguravam que a comida não iria faltar.

Quando todos terminavam, os homens não se preocupavam em tirar sequer seus pratos da mesa. Voltavam imediatamente para seus lugares na sala ou encontravam alguma cama vazia para fazerem a sesta — o tão necessário e “merecido” cochilo.

Já as mulheres se dividiam em várias tarefas: limpar a mesa, lavar a louça e varrer o chão. Também passavam um café fresquinho, que levavam nas xícaras para os homens, e ainda esperavam que eles bebessem para voltar à cozinha e lavá-las. Elas ainda tinham que supervisionar as crianças que, em geral, os homens não sabiam onde estavam nem o que estavam fazendo. A menos, é claro, quando elas estavam atrapalhando conversas, sono ou a conversa que era de adultos.


Se você se identificou com essa cena e já viveu ou a presenciou em algum momento da sua vida, sabe que o dia das mães, para a imensa maioria das mulheres, é mais um dia de um trabalho invisibilizado, exaustivo e nada valorizado. E o mais assustador disso tudo é que essa cena continua acontecendo em 2025. Não é algo que acontecia somente no início dos anos de 1970 (quando eu era criança) e, de lá para cá, evoluímos: os homens também passaram a executar os trabalhos domésticos e de cuidado.


Fato é que os dados e fenômenos que observamos no século XXI são assustadores. Antes de apresentar dados, sugiro que você faça uma busca rápida no Google, precisamos falar do patriarcado.

Sim. Tudo o que as mulheres e homens vivem até hoje é uma construção cultural criada para beneficiar um em detrimento do outro. Não tem nada a ver com o que as pessoas machistas e supremacistas nos querem fazer acreditar serem razões biológicas ou até religiosas para justificarem a opressão das mulheres, das mães.

Vi um post do perfil @themerakiproject no Instagram intitulado “The privilege of not noticing: how patriarchy benefits men in ways they rarely realise ou acknowledge” de Sonali Pamnani Jhabakh. A tradução livre seria: “O privilégio de não ser notado: como o patriarcado beneficia os homens de maneiras que eles raramente se dão conta ou têm consciência”.

Ao ler esse post, me deparei com questões que sempre fizeram muito sentido para mim. Elas explicam esse conforto no qual os homens se encontram. E por que eles não abraçariam as causas das mulheres nem abririam mão de seus próprios privilégios.

Ao contrário, o que estamos vendo é uma onda altamente conservadora, encabeçada por certas denominações religiosas, especialmente neopentecostais, que reforçam o papel da mulher submissa, do lar e responsável única pela criação e educação dos filhos. Grupos como os Lendários, nos quais os homens pagam de R$1.800,00 a até R$81.000,00 para passarem alguns dias subindo montanhas para “aprenderem a ser homens” nada mais são do que espaços de promoção da misoginia.

Voltando ao post de Sonali, alguns pontos servem para fazermos uma reflexão mais aprofundada sobre o papel do patriarcado e os impactos altamente negativos na sociedade, nos números de violência doméstica e de doenças mentais.

Para começar, ela faz uma afirmação bastante necessária:

“O patriarcado não machuca só as mulheres. Ele amortece, protege e privilegia os homens — quase sempre de maneiras tão normalizadas que se tornam invisíveis àqueles que se beneficiam delas. Muitos homens não caíram na real do quanto a sua liberdade, conforto e segurança são construídos em cima de um sistema que espera que a mulher encolha, suporte e carregue fardos que nunca deveriam ser apenas delas.”

Isso tudo é tão verdadeiro que, como ilustrei na história de minha avó e das mulheres de minha família (que são, na verdade, todas as mulheres), educa-se meninas para os afazeres domésticos e cuidados enquanto que dos meninos não se espera sequer que retirem seus próprios talheres e prato da mesa.

“Nada disso é um descuido inofensivo: é um trabalho emocional de gênero e espero que seja realizado por apenas um dos lados (o da mulher)” – Sonali

Para além disso, no patriarcado, segundo post de Sonali, espera-se que a mulher sempre exceda as expectativas sociais, enquanto dos homens se espera o mínimo. Ser medíocre não é problema para os homens.

Quando se trata de violências, as mulheres precisam estar o tempo todo em estado de alerta, vigilantes e sempre são infinitamente mais vulneráveis. O privilégio da liberdade de transitar por diversos espaços é algo natural para os homens.

Certa vez, um jovem com menos de 20 anos, filho de pais altamente machistas, me disse que o papel do homem era “proteger” as mulheres. Quando lhe perguntei por que e do que as mulheres precisavam ser protegidas e lhe disse que se os homens não fossem ameaças para as mulheres, elas não precisariam ser protegidas, não só o jovem como os outros adultos à mesa não conseguiram apresentar uma única argumentação.

Quando eu disse que se o mundo fosse tão seguro para as mulheres, as pessoas pretas, as pessoas LGBTQUIAPN+, as com deficiência como é para os homens héteros, ricos e brancos, o único papel esperado de toda a sociedade seria o de RESPEITAR todas as pessoas e não de protegê-las, porque não se sentiriam ameaçadas.


Um outro ponto que Sonali traz é o fato de o homem ser sempre aplaudido e reverenciado quando coloca a carreira em primeiro lugar. Quando a mulher faz o mesmo, costumam taxá-la de egoísta, irresponsável e fria. Neste sentido, o patriarcado presenteia o homem e pune a mulher.


Sobre mulheres e homens, não dá para negar o quanto, desde a infância, a sociedade marca os corpos das mulheres com críticas ou desejos. Enquanto praticamente não existem regras sobre a liberdade dos corpos dos homens — inclusive no que diz respeito à fertilidade. A sociedade impõe todas as regras aos corpos das mulheres, especialmente sobre fertilidade e maternidade.

Na esteira das crenças e arquétipos, dos homens não se espera inteligência emocional; ao contrário, são racionais, objetivos e têm crédito. Apesar disso, as pessoas sempre oferecem todas as desculpas aos homens quando eles cometem algum erro ou violência. Frases como “ele estava estressado”, “estava num mau dia”, “está aprendendo” são mais que comuns.

E a mulher? Para começar, os arquétipos que dominam a crença coletiva são dois. De um lado, Eva, a pecadora que tirou o homem do paraíso. De outro, Maria, a mãe virgem, imaculada e sofredora, que abre mão da própria vida para seguir os passos do filho, mesmo que no anonimato. Emotiva, espera-se que seja recatada, que não se pronuncie em alto tom, que coloque as necessidades dos homens e filhos em primeiro lugar e por aí vai. Aquela que se posiciona, quebra “regras”, fala alto… cabe-lhe o lugar de louca ou bruxa.

Neste dia das mães e todos os outros do ano, muito pouco temos para comemorar. Se quisermos, de fato, construir uma sociedade mais justa, precisamos começar por uma profunda mudança neste modelo patriarcal e misógino. Sem as mulheres, o mundo não só deixa de existir, a humanidade definitivamente fracassa. Fazer cada um a sua parte, mesmo que como uma marolinha, é o único caminho para construirmos um mar de transformações e de vida.


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Quer entender melhor como o patriarcado impacta a experiência das mulheres no Dia das Mães, transformando celebrações em jornadas de exaustão invisível? Então, entre em contato comigo. Terei o maior prazer em falar a respeito.

Cris Ferreira
https://soucrisferreira.com.br/

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Cristiane Ferreira é Coach formada pelo IBC – Instituto Brasileiro de Coaching, Professora da Fundação Getúlio Vargas com cadeiras em Liderança, Coaching, Inteligência Emocional, Técnicas de Comunicação e Empreendedorismo, Palestrante, Empresária do setor de Educação desde 1991, Graduada em Letras pela UFMG e Pós-graduada em Linguística Aplicada pela UFMG, MBA em Gestão de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas, Formada em Inglês pela University of New Mexico, EUA, Apresentadora do Programa Sou Múltipla, Fundadora da Associação das Mulheres Empreendedoras de Betim, Ex-Presidente da Câmara Estadual da Mulher Empreendedora da Federaminas (2014/2016), Destaque no Empreendedorismo feminino, recebeu vários prêmios entre eles o “Mulheres Notáveis – Troféu Maria Elvira Salles Ferreira” da ACMinas, troféu Mulher Líder, “Medalha Josefina Bento” da Câmara Municipal de Betim, “Mulher Influente” do MG Turismo e o “Mérito Legislativo do Estado de Minas Gerais”, Comenda Amiga da Cultura da Prefeitura Municipal de Betim.
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