
Ansiedade no Século 21: A Visão da Psicanálise e o Papel do Coaching
A ansiedade, por vezes descrita como a “doença do século 21”, tece-se na tapeçaria da existência humana, manifestando-se com uma intensidade e prevalência sem precedentes em nossos tempos. Para compreendê-la em sua profundidade, é imperativo mergulhar além dos sintomas superficiais. Buscar as raízes em nossa psique e na estrutura da nossa relação com o mundo.
A psicanálise, com seu olhar arguto sobre o inconsciente e a subjetividade, oferece um caminho robusto para essa compreensão, munindo não apenas terapeutas, mas também profissionais como os coaches, de ferramentas para escutar e guiar seus interagentes e coachees na desafiadora jornada em busca de um reequilíbrio.
A Ansiedade Através dos Tempos: Do Existencial ao Patológico
A angústia, precursora da ansiedade moderna, não é um fenômeno novo. Filósofos da Antiguidade, como os estoicos, já ponderavam sobre a inquietação da alma diante da incerteza da vida e da inevitabilidade da morte. Kierkegaard, no século XIX, elevou a “angústia” a uma categoria existencial, a vertigem da liberdade e da possibilidade.
No entanto, o século XXI, com seu ritmo frenético, a superabundância de informações, a pressão por desempenho e a constante conectividade digital, transformou essa angústia existencial em uma ansiedade generalizada, muitas vezes patológica, que permeia o cotidiano de milhões.
Freud e a Arquitetura da Ansiedade: Um Sinal Inconsciente
Sigmund Freud, o pai da psicanálise, dedicou-se extensivamente ao estudo da ansiedade, inicialmente vinculando-a a uma libido não descarregada. Contudo, em sua segunda teoria da ansiedade, ele a reposicionou como um sinal de perigo para o ego. Para Freud, a ansiedade não é apenas um sintoma, mas uma função vital. Um mecanismo de alerta que o ego utiliza para antecipar ameaças – sejam elas externas (ansiedade realística), internas provenientes das pulsões do id (ansiedade neurótica), ou originárias da severidade do superego (ansiedade moral).
A ansiedade, nessa perspectiva, é profundamente ligada a conflitos inconscientes. Desejos reprimidos, traumas não elaborados e as incessantes demandas do id e do superego tensionam o ego, que, diante da iminência de ser sobrecarregado, emite o sinal de ansiedade. Para o coach, essa visão freudiana sugere que os sintomas de ansiedade do coachee são, na verdade, mensagens de algo mais profundo que precisa ser reconhecido. Não se trata de “curar” um sintoma, mas de investigar o conflito subjacente.
Lacan e o Desamparo do Sujeito: A Ansiedade na Ausência da Falta
Jacques Lacan, em sua releitura da obra freudiana através da linguística e da filosofia, oferece uma perspectiva ainda mais complexa e radical da ansiedade. Para Lacan, a ansiedade não é o medo de um objeto (o medo tem um objeto); a ansiedade é o afeto que emerge quando o sujeito se depara com a ausência da falta (o manque-à-être).
O sujeito humano é, por excelência, um ser de falta, um ser de desejo. É a falta que nos impulsiona, que nos coloca em busca de algo que sempre nos escapa, que mantém o fluxo do desejo. Quando essa falta é estranhamente preenchida, ou quando o desejo do outro (sociedade, figuras parentais, expectativas) se apresenta de forma excessiva e não mediada, sem espaço para a própria falta do sujeito, a ansiedade irrompe. É o desamparo do sujeito diante de um Real sem mediação simbólica, de uma demanda sufocante que não deixa espaço para o próprio ser.
Para o coach, a visão lacaniana convida a uma escuta atenta sobre o que o coachee experimenta como “sufocamento” ou “invasão”. A ansiedade pode sinalizar que o coachee está preso a ideais alheios. Ou que a estrutura simbólica que o sustenta está em xeque, deixando-o confrontado com um vazio existencial ou uma presença insuportável do outro. O trabalho não é preencher a falta, mas ajudar o coachee a significar sua própria falta e a articular seu desejo genuíno.
Augusto Cury: A Gestão da Emoção e a Construção da Resiliência
Augusto Cury, embora com uma abordagem mais voltada para a psicologia cognitiva e a educação emocional do que para a psicanálise stricto sensu, traz contribuições valiosas que complementam a compreensão da ansiedade, especialmente no contexto prático do coaching. Cury enfatiza a gestão da emoção e a importância do Eu como gestor do teatro da mente.
Seus conceitos, como a Síndrome do Pensamento Acelerado (SPA) e a necessidade de “dúvidar, criticar e determinar” (DCD) os pensamentos destrutivos, oferecem um arcabouço prático para lidar com os sintomas manifestos da ansiedade. Cury nos lembra que, embora as raízes da ansiedade possam ser profundas, a forma como processamos e reagimos aos nossos próprios pensamentos tem um impacto direto em nosso bem-estar emocional. Ele convida à construção de uma “inteligência multifocal”, onde o Eu aprende a navegar pelos fluxos de pensamento, evitando armadilhas como o autoflagelo e a superanálise.
Para o coach, a abordagem de Cury serve como uma ponte entre a compreensão profunda da ansiedade e a ação prática. Após a escuta e a compreensão dos conflitos subjacentes (Freud) ou da dinâmica da falta (Lacan), o coach pode guiar o coachee em técnicas de gerenciamento de pensamentos, pausas cognitivas e construção de um Eu mais robusto e resiliente diante dos desafios.
A “Cura” para o Coach: Escutar, Acolher e Ressignificar
A “cura” para a ansiedade, do ponto de vista psicanalítico, não é uma erradicação, mas uma ressignificação e integração desse afeto tão fundamental. Para o coach, isso se traduz em um trabalho de escuta profunda e acolhimento, onde o coachee é convidado a:
- Reconhecer a Ansiedade como um Sinal: Ajudar o coachee a entender que a ansiedade é uma mensagem, um alerta, e não uma fraqueza. É uma oportunidade para investigar o que está desequilibrado em sua vida (Freud).
- Explorar o Vazio e o Desejo: Fomentar a reflexão sobre o que verdadeiramente falta ou o que sufoca o coachee. Qual é o seu desejo genuíno, em contraste com as expectativas externas? Onde a falta de espaço para o próprio ser se manifesta? (Lacan).
- Desenvolver Ferramentas de Gestão Emocional: Guiar o coachee na prática de técnicas para lidar com o fluxo de pensamentos, a aceleração mental e as reações emocionais, construindo resiliência e um Eu mais forte (Cury).
O coach não busca “curar” no sentido médico, mas sim habilitar o coachee a navegar pela complexidade de sua própria psique. Transformar a ansiedade de um inimigo paralisante em um catalisador para o autoconhecimento e o crescimento. A ansiedade do século XXI nos convoca a um mergulho mais profundo em nós mesmos. E a psicanálise, com seus grandes mestres, oferece as coordenadas para essa jornada essencial.
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Um abraço e até a próxima!
Iússef Zaiden Filho
http://www.izfcoaching.com.br/
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