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A Imposição de uma Educação Servil!

Quando pensamos em um projeto nacional de educação, ou em um programa de Coaching, temos que ter consciência clara do que nós queremos: pessoas inteligentes, criativas, capazes de resolver problemas e adaptar as dinâmicas de trabalho para competir em alto nível.

A nova proposta de mudança do ensino médio, imposta pela Medida Provisória 746/2016, tem reforçado nosso atraso social e alimentado o descontentamento de muitos setores da sociedade contra os empresários brasileiros. Alegando uma “pseudo liberdade de escolha” das disciplinas e uma maior “sintonia” com o mercado de trabalho, as consequências nefastas dessa política educacional são importantes para pensarmos os sucessos e fracassos do Coaching enquanto processo ético-pedagógico.

As propostas educacionais da MP 746 me lembram um dossiê de 2005 da Harvard Education Review sobre as políticas de educação pública no século XX. O enfoque eram os Estados Unidos, mas as comparações dos pesquisadores com os países centrais e periféricos nos trouxeram uma compreensão nova sobre as políticas educacionais da América Latina.

Uma das características apontadas que diferencia os países desenvolvidos dos subdesenvolvidos era seu projeto de cidadão. Países como Noruega, Suíça, Alemanha e Países Baixos possuíam uma clara orientação em desenvolver ao máximo as potencialidades físicas e cognitivas de seus cidadãos, incentivando a criatividade e a capacidade de mudança. Países subdesenvolvidos como o Brasil costumam manter uma política educacional servil, voltada para o mercado de trabalho, comprometendo as possibilidades de mudança social. Enquanto os países desenvolvidos produziam e ensinavam Filosofia, Sociologia, Artes, e noções básicas de Política, Economia e Direito nas escolas, os países subdesenvolvidos ignoravam tais disciplinas consideradas “inúteis e subversivas” e focavam nos conhecimentos mais básicos das ciências biológicas e exatas que serviam ao mercado. Um exemplo brasileiro é a imposição do conteúdo de Química Orgânica pela ditadura civil-militar tendo como única justificativa a formação de quadros humanos para a Petrobras.

Por que uma educação reducionista e voltada para o mercado de trabalho é tão perversa? Há muitas razões, mas vou destacar as três mais importantes.

Primeiro, a ineficiência: no capitalismo, tanto a indústria, quanto o comércio estão sempre mudando e se renovando. Novas demandas aparecem, ofertas diferentes precisam ser criadas e os recursos tecnológicos afetam constantemente as cadeias de produção e serviço. O leitor sabe que, quando nos formamos na universidade para exercer uma profissão, ficamos desatualizado e despreparado no dia seguinte. Agora, pense que estamos condenando os jovens brasileiros, desde o ensino básico, a se prepararem para um mercado de trabalho que não existirá quando eles saírem da escola. É estranho como os capitalistas de países subdesenvolvidos ainda não entenderam a dinâmica do mercado e continuam defendendo uma educação que só funciona nos sistemas feudais ou nas economias planificadas (vulgo socialistas).

Segundo, o alto custo: Muitos empresários alienados pensam que uma educação básica voltada para as necessidades do mercado diminui seus custos de treinamento e torna seus funcionários mais competitivos. Quando, por motivos já citados, seus funcionários não chegam preparados, eles reclamam do governo e das universidades. No mundo desenvolvido os capitalistas já sabem que, graças à natureza do capitalismo, nenhum trabalhador chega preparado para trabalhar. Logo, as empresas se preocupam em oferecer treinamentos constantes. Mas por que esses países gastam menos com o treinamento e têm mais resultados? A resposta é simples: seus quadros humanos não foram adestrados durante a escolarização para agir e pensar nos moldes dos antigos sistemas. É mais barato e eficiente treinar os empregados destreinados do que corrigir e impor uma nova dinâmica de trabalho.

Terceiro, a servidão: A maioria das empresas de ponta está sediada em países desenvolvidos e possui um regime de trabalho flexível e adaptado ao funcionário como acontece com o Google, a Apple, a Intel, a P amp;G, a Nestlé, a Nokia e muitas outras empresas Blue Chips. Pessoas educadas que preservam sua personalidade e criatividade não se fecham em caixinhas ou em rotinas. Elas opinam, inventam, contestam, dialogam e geram mudanças. Uma visão ampla de mundo, influenciada por conhecimentos como Filosofia, Sociologia e Artes, tornam seus colaboradores e suas empresas dominantes no mercado. São capazes de mudar uma empresa para se adaptar aos novos consumidores e às novas tecnologias. Elas ditam o ritmo, as mudanças e as tendências. Já uma educação tecnicista não gera “boas pessoas”, mas “trabalhadores servis”. Países desenvolvidos preferem cidadãos preparados intelectualmente para competir e mudar o mundo, já os países subdesenvolvidos preparam uma mão de obra técnica servil, totalmente incapaz de questionar, mudar ou competir em alto nível. São compradores e reprodutores de conhecimento alheio.

Quando pensamos em um projeto nacional de educação, ou em um programa de Coaching, temos que ter consciência clara do que nós queremos: pessoas inteligentes, criativas, capazes de resolver problemas e adaptar as dinâmicas de trabalho para competir em alto nível, ou técnicos de fácil obsolescência, incapazes de pensar fora da caixa, capatazes insensíveis que sacrificam as subjetividades do quadro humano para satisfazer as organizações e caprichos de seus empregadores? Queremos pessoas que resolvam problemas e estabelecem novas dinâmicas, ou queremos um bom capacho que só persegue metas? Pessoas éticas e os capitalistas de sucesso certamente optam pela primeira opção. Uma educação mais humana, abrangente e plural é essencial para sobreviver em um mundo onde ocorrem constantes transformações.

Arthur Meucci possui bacharelado, licenciatura e mestrado em Filosofia pela Universidade de São Paulo, Doutorado em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Mackenzie, com especialização em Diálogos entre Filosofia, Cinema e Humanidades pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e formação em Psicanálise pelo Instituto Brasileiro de Ciência e Psicanálise. Trabalhou por dez anos com ensino e consultoria na empresa Espaço Ética e escreveu em coautoria livros best-sellers como A vida que vale a pena ser vivida (Ed. Vozes), O Executivo e o Martelo (Ed. HSM) e a coleção Miniensaios de Filosofia (Vozes). Atualmente é Professor Adjunto da Universidade Federal de Viçosa.
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