
Liderança Feminina Não Se Negocia, Ela Se Constrói
Durante muito tempo, o espaço da mulher em posições de liderança foi colocado como concessão: “deixaram ela entrar”, “ela foi a escolhida”. Essa narrativa reforça a ideia de que ocupar lugares de decisão depende de permissão externa, e não de direito, preparo e legitimidade. Mas quando falamos de liderança feminina, precisamos afirmar algo essencial: o lugar da mulher não se negocia, ele se constrói.
E essa construção não é imediata, nem linear. É fruto de escolhas consistentes, enfrentamentos corajosos e da capacidade de transformar obstáculos em degraus. Não se trata de ocupar apenas uma cadeira na mesa de decisão, mas de ressignificar o próprio conceito de liderança, mostrando que é possível conduzir com sensibilidade, firmeza e propósito.
Construir esse lugar significa ir além do desempenho técnico impecável — algo que muitas vezes as mulheres já têm em excesso, na tentativa de provar valor. É compreender que liderança não é apenas resultado, é também presença, influência e visão estratégica.
Segundo dados do IBGE (2023), embora as mulheres representem 44,6% da força de trabalho formal no Brasil, ocupam apenas 38,8% dos cargos de gestão e menos de 20% das posições executivas. Essa disparidade não está relacionada à falta de competência, mas a barreiras estruturais e culturais que ainda insistem em limitar o avanço feminino.
Essas barreiras assumem diferentes formas:
1. O Teto de Vidro
É uma barreira invisível que impede mulheres de avançarem para cargos de liderança mais altos (como diretoria, vice-presidência e presidência), mesmo quando possuem competência, experiência e resultados comprovados.
Exemplo: Uma mulher pode crescer na carreira até cargos de média gerência, mas encontra dificuldade em ser promovida ao nível executivo porque prevalecem preconceitos inconscientes de que “homens têm mais perfil de liderança” ou porque a empresa não promove políticas de equidade.
Impacto: Limita o acesso das mulheres ao centro de poder e às decisões estratégicas, perpetuando a desigualdade.
2. As Paredes Invisíveis
Representam a segregação horizontal no mercado de trabalho. Ou seja, mulheres são direcionadas para áreas consideradas de “suporte” (como RH, comunicação, educação, saúde), enquanto os homens ocupam majoritariamente funções em setores estratégicos (como finanças, tecnologia, operações).
Exemplo: Uma mulher é incentivada a seguir carreira no RH, enquanto um homem com perfil parecido é incentivado a atuar em áreas de estratégia ou engenharia, que têm maior visibilidade e impacto nos resultados do negócio.
Impacto: Essas paredes limitam a mobilidade das mulheres dentro das organizações, mantendo-as afastadas de setores-chave que costumam ser porta de entrada para cargos de alta liderança.
3. O Fenômeno da Impostora
É a sensação psicológica de inadequação, comum em muitas mulheres líderes, mesmo quando têm provas claras de suas capacidades. A mulher sente que não pertence àquele espaço ou que “não é tão boa quanto os outros pensam”, atribuindo conquistas à sorte, ajuda externa ou circunstâncias.
Exemplo: Uma executiva que acabou de ser promovida, duvida de si mesma, sente medo de ser “descoberta” como uma fraude e pensa que em breve os outros perceberão que ela não é competente, mesmo tendo histórico de resultados expressivos.
Impacto: Esse fenômeno mina a autoconfiança, aumenta a ansiedade e pode fazer mulheres renunciarem a promoções, projetos estratégicos ou espaços de liderança, perpetuando os efeitos do teto de vidro e das paredes invisíveis.
Esses três conceitos se interligam:
- O teto de vidro bloqueia a ascensão vertical;
- As paredes invisíveis restringem a movimentação horizontal;
- O fenômeno da impostora age internamente, reforçando essas barreiras externas.
Cada um desses desafios reforça que o lugar não é dado: ele precisa ser construído, legitimado e consolidado, tanto individual quanto coletivamente.
Muitas vezes, ao chegar em um cargo de liderança, a mulher é pressionada a “se masculinizar” para ser aceita. Exige-se que ela seja dura, competitiva, quase insensível. Esse é um equívoco. O verdadeiro poder está em liderar sem renunciar à própria autenticidade.
A pesquisa de Ely, Ibarra e Kolb (2011) mostra que lideranças femininas tendem a adotar práticas mais colaborativas, inclusivas e orientadas ao cuidado, o que favorece ambientes de maior engajamento e inovação. Esses traços não são fragilidades: são ativos estratégicos.
Portanto, construir o lugar da liderança feminina é também construir novos modelos de liderança — baseados na empatia, na inteligência emocional e na coragem de expor vulnerabilidades quando necessário. Não é imitar um padrão masculino, mas ampliar as possibilidades do que significa liderar.
4 Pilares Fundamentais para Construir a Liderança Feminina
No meu trabalho de pesquisa e prática em programas de liderança, identifiquei quatro pilares fundamentais que sustentam a construção desse lugar:
- Autoconhecimento profundo – entender suas forças, valores e limites para liderar de forma alinhada à própria identidade;
- Resgate da autoconfiança – reconhecer conquistas, celebrar avanços e não deixar que a síndrome da impostora sabote seu espaço;
- Inteligência emocional e comunicação assertiva – gerir conflitos, influenciar com clareza e construir confiança ao redor;
- Visão estratégica e influência organizacional – enxergar além da própria função, atuando de forma sistêmica e transformadora.
Esses pilares não são teóricos: eles se traduzem em práticas diárias, desde a forma de conduzir reuniões até a maneira de se posicionar em situações de pressão.
Embora a construção seja pessoal, ela também é coletiva. Nenhuma mulher chega sozinha. Redes de apoio, grupos de mentoria e líderes que patrocinam talentos femininos são fundamentais para ampliar portas.
Quando uma mulher ocupa uma posição de liderança, não representa apenas a si mesma: ela se torna referência para outras, prova viva de que esse lugar é possível. Isso gera um efeito multiplicador: meninas e jovens mulheres passam a enxergar novos horizontes para suas carreiras.
Esse movimento coletivo é urgente. De acordo com o relatório Women in Business (Grant Thornton, 2022), a presença de mulheres em posições de comando atua como fator motivacional para toda a sociedade, quebrando estereótipos e ampliando possibilidades. Ou seja, quando construímos o nosso lugar, ajudamos a construir o lugar de muitas outras.
Não espere o reconhecimento externo para validar sua liderança!
Deixo esse convite para cada mulher que lê este texto. O lugar da mulher não se negocia. Não se trata de esperar que alguém abra espaço ou conceda permissão. Ele se constrói na firmeza das escolhas, na consistência das entregas e na coragem de se posicionar.
Construa-o com autenticidade, com propósito e com o entendimento de que sua presença não é apenas individual, mas transformadora para toda a cultura organizacional.
E, sobretudo, lembre-se: liderar é também abrir caminho para que outras possam vir.
O lugar da liderança feminina é obra em andamento, construída na prática cotidiana. Ele se ergue quando mulheres se reconhecem como legítimas líderes, quando transformam vulnerabilidade em força e quando ousam conduzir de forma diferente.
Não é um espaço que se pede, se implora ou se negocia. É um espaço que se constrói, afirma e consolida.
E cada mulher que escolhe se levantar e ocupar esse lugar não só fortalece a si mesma, mas muda o futuro das organizações e da sociedade.
Gostou do artigo?
Quer saber mais sobre por que a liderança feminina não se negocia e como construir o seu lugar com autenticidade e propósito? Então, entre em contato comigo. Terei o maior prazer em conversar a respeito.
Até a próxima!
Luciana Soares Passadori
https://www.passadori.com.br
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