
Emoção ou Razão: Quem Realmente Guia Nossas Decisões?
Recentemente, em uma conversa informal com um amigo profissional de criação publicitária, surgiu um debate interessante. Será que ao tomar uma decisão, o ser humano sempre é influenciado pela sua emocionalidade? Ou será que há situações em que a racionalidade será imperativa?
O argumento de que, como elemento final, a decisão sempre será guiada pela emoção, significa que estaremos apostando na esperança e na confiança de que a escolha tenha sido a melhor opção, ainda que saibamos de um potencial risco de que pode não dar certo.
Por outro lado, entendemos que há decisões tipicamente por impulso, baseadas em pura emoção, mas também há aquelas que são tomadas após uma avaliação detalhada de prós e contras, com potenciais perdas e ganhos.
Quando nos deparamos com uma escolha — desde algo simples, como decidir o que comer, até algo complexo, como investir na bolsa ou comprar uma casa — surge uma questão antiga: somos guiados pela emoção ou pela racionalidade?
Então, aproveitando que temos recursos de inteligência artificial para nos ajudar, somando a uma experiência prévia deste colunista como pesquisador acadêmico, decidi levar o assunto à frente e construir uma linha de pensamento baseada nas referências de artigos e estudos já publicados. A seguir, aqui vem uma compilação que, espero, possa estimular uma agradável reflexão ao leitor. Ao final da postagem estão listadas as referências aqui adotadas, considerando que não houve compromisso com a revisão total da literatura existente para o assunto.
De um lado, há quem defenda que, no momento final, sempre é a emoção que pesa: a esperança de ter feito a melhor escolha, a confiança de que tudo dará certo, mesmo diante de riscos. De outro lado, há situações em que análises detalhadas de prós e contras parecem de fato dominar, como nas decisões financeiras ou de negócios. A verdade, porém, é que a ciência já mostrou: razão e emoção não são forças opostas, mas complementares. Toda decisão humana é híbrida.
A inevitável influência das emoções
As emoções são mecanismos evolutivos que funcionam como atalhos mentais. Elas nos ajudam a agir rapidamente diante de riscos, sem precisar calcular probabilidades em cada passo. Esse “atalho” pode ser útil ou, em certos casos, pode nos levar a equívocos.
- Compras impulsivas: uma sensação de prazer, nostalgia ou pertencimento pode nublar a análise objetiva e levar alguém a gastar mais do que o planejado (e em itens desnecessários);
- Reações de medo: ao sentir perigo, ativamos respostas de luta ou fuga antes mesmo de avaliar friamente os fatos. Esse mecanismo que garantiu a sobrevivência dos ancestrais pode, hoje, levar à procrastinação ou a decisões precipitadas;
- Influência social e política: em debates polarizados, muitas vezes os argumentos perdem espaço para a carga emocional de quem os defende.
Ou seja: mesmo quando acreditamos estar agindo de forma lógica, as emoções frequentemente já prepararam o terreno do nosso julgamento.
O fim da racionalidade pura: descobertas da neurociência
Um dos estudos mais emblemáticos é o do neurocientista António Damásio, apresentado em O Erro de Descartes (1995). Ao investigar pacientes com lesões em áreas cerebrais ligadas às emoções, Damásio percebeu que, embora essas pessoas mantivessem plena capacidade lógica, eram incapazes de tomar decisões cotidianas simples.
Isso o levou à chamada hipótese do marcador somático: nossas experiências emocionais deixam “marcas” que ajudam a sinalizar rapidamente se uma escolha é boa ou ruim. Essa intuição visceral — um frio na barriga ou uma sensação de confiança — atua como bússola para que não fiquemos paralisados na análise interminável de opções. Assim, as emoções não serão falhas da razão, mas sim mecanismos que tornam possível decidir em cenários complexos e incertos.
Economia comportamental: quando a emoção domina os números
A teoria clássica do Homo Economicus — o ser humano totalmente racional, que decide sempre maximizando seu interesse — já foi amplamente contestada por estudiosos. Pesquisas de Daniel Kahneman e Amos Tversky mostraram que, mesmo em ambientes dominados por dados e planilhas, como o mercado financeiro, os vieses emocionais acabam influenciando no comportamento e na tomada de decisão.
- Aversão à perda: perder causa um impacto emocional quase duas vezes mais forte do que o prazer de ganhar a mesma quantia. Isso leva investidores a decisões aparentemente contraditórias, como manter ativos em queda ou vender cedo demais os que estão subindo;
- Excesso de confiança: sentimentos de otimismo exagerado e autoconfiança fora do controle fazem pessoas se arriscarem mais do que seria prudente, muitas vezes até colocando a própria vida em risco.
Mesmo em processos altamente técnicos, como comprar um imóvel ou negociar na bolsa de valores, é a emoção que dá o empurrão final: esperança, medo ou confiança.
O papel da racionalidade: estrutura e organização
Se as emoções dão o impulso, a racionalidade fornece o método. Quando avaliamos cenários complexos, recorremos a ferramentas racionais para estruturar o processo de escolha, por exemplo:
- Análise de cenários: avaliar possibilidades otimistas, pessimistas e realistas;
- Modelagem financeira: planilhas e projeções para mensurar riscos e retornos;
- Regras pré-definidas: critérios objetivos antes de decidir, reduzindo espaço para impulsos;
- Ferramentas estruturadas: matrizes de decisão, análises SWOT ou testes de sensibilidade ajudam a limitar os vieses emocionais.
Esse é o papel da chamada racionalidade limitada, conceito de Herbert Simon (1956). Como não conseguimos processar todas as variáveis possíveis, buscamos então soluções “boas o suficiente” (satisficing), em vez da opção perfeita. E, nesse momento de encerrar a análise, o alívio emocional tem peso decisivo.
Pontos de encontro: a decisão híbrida
Pesquisas atuais em psicologia e neurociência convergem para uma conclusão: a tomada de decisão é sempre um processo híbrido.
- A emoção inicia: o desejo de conquistar algo, o medo de perder, a ambição de crescer;
- A razão processa: coleta de dados, cálculos, projeções e comparações;
- A emoção finaliza: confiança, esperança ou intuição determinam quando se deve parar de analisar e, então, que chegou o momento de agir.
Como sintetizou Carla Tieppo, as emoções funcionam como “dados de valência”: atribuem significado rápido às opções, informando a razão sobre o que pode ser bom ou ruim.
Estratégias para equilibrar emoção e razão
Saber que nunca somos totalmente racionais nem puramente emocionais, esse é o primeiro passo para que possamos tomar melhores decisões. Algumas práticas ajudam a equilibrar ambos os lados:
- Autoconsciência emocional: identifique o que você sente antes de decidir. Pergunte-se: “meu medo ou entusiasmo está me guiando mais do que os fatos?”;
- Base sólida de informações: colete dados confiáveis de múltiplas fontes assim reduzindo o espaço para distorções emocionais;
- Estrutura deliberativa: use ferramentas analíticas para organizar os prós e contras;
- Simulação mental: imagine as consequências de longo prazo de cada escolha e observe sua reação emocional a esses cenários;
- Consulta externa: buscar a visão de terceiros ajuda a expor vieses e equilibrar perspectivas.
Conclusão
Nem as decisões mais calculadas escapam da emoção, nem as mais impulsivas deixam de conter alguma racionalidade. Emoção e razão formam uma dupla inseparável na vida humana.
Enquanto a emoção nos conecta a valores, desejos e experiências passadas, a razão nos dá método e clareza para estruturar escolhas. O equilíbrio entre ambas não apenas enriquece a decisão, mas também aumenta a chance de os resultados serem sustentáveis e satisfatórios. No fim, o segredo não é escolher entre razão e emoção, mas aprender a deixá-las dialogar em todos os seus momentos de reflexão e decisão.
Eu sou Mario Divo e acompanhe-me pelas mídias sociais ou pelo site www.mariodivo.com.br.
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Quer saber mais sobre como emoção e razão moldam suas decisões, mesmo quando você acredita estar sendo racional? Então entre em contato comigo. Terei o maior prazer em responder.
Até nossa próxima postagem!
Mario Divo
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Observação importante: Não houve a preocupação em apresentar esta postagem com formato acadêmico, mas sim fazer a compilação resumida das principais conclusões incluídas nas fontes referenciadas. Os leitores que, porventura, queiram avançar nesse tema, terão então nessas fontes as informações adicionais que muito poderão contribuir com a construção de opinião.
Referências - Artigos recentes: Marques, R. H.; Violant-Holz, V.; Damião da Silva, E. (2024). Emotions and decision-making in boardrooms — a systematic review from behavioral strategy perspective. Frontiers in Psychology, 15, 1473175. https://www.frontiersin.org/journals/psychology/articles/10.3389/fpsyg.2024.1473175/full Li, Y.; Song, Z.; Jin, S.; Zhang, D. (2024). How do emotions respond to outcome values and influence choice? Psychological Research. https://doi.org/10.1007/s00426-024-02001-3 https://wrap.warwick.ac.uk/view/divisions/warwick=5Fbusiness=5Fschool/2024.html Mikels, J. A.; Tallahu, D. B. (2023). Emotion, Aging, and Decision Making: A State of the Art Mini-Review. Advances in Geriatric Medicine and Research, 5(1), e230003. https://doi.org/10.20900/agmr20230003 https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/37216197/ Peng, C.; Chen, Y.; Li, W.; Xu, Z. (2024). Emotion-impacted Decision-making under Risks. Advances in Social Behavior Research, 4(1). https://doi.org/10.12345/asbr.2024.18309 Tieppo, C. (2023 - em Endosfera). Emoção na tomada de decisão: suas escolhas são mesmo racionais? https://endosfera.santodecasa.net/emocao-na-tomada-de-decisao/ Tsubomi, H.; Takeda, Y.; Sugiura, M. (2024). Highly logical and non-emotional decisions in both risky and social contexts: understanding decision making in autism spectrum disorder through computational modeling. Cognitive Processing. https://doi.org/10.1007/s10339-024-01182-4 PUCRS Online. Emoção na Tomada de Decisão: Impactos e Complexidade. 26 de março de 2025. https://online.pucrs.br/blog/emocao-tomada-decisao-complexidade
Outras referências: Damásio, A. (1995). O Erro de Descartes: Emoção, Razão e o Cérebro Humano. Lisboa: Publicações Europa-América. Kahneman, D., & Tversky, A. (1979). Prospect Theory: An Analysis of Decision under Risk. Econometrica, 47(2), 263-291. Loewenstein, G., Weber, E. U., Hsee, C. K., & Welch, N. (2001). Risk as Feelings. Psychological Bulletin, 127(2), 267-286. MundoPsicologos.com. O papel das emoções na tomada de decisões: Como equilibrar razão e sentimento. 28 jul. 2023. SBIE.com.br. Blog: Tomada de Decisão Emocional: O Papel das Emoções no Processo de Tomada de Decisão. 23 out. 2024. Simon, H. A. (1956). Rational choice and the structure of the environment. Psychological Review, 63(2), 129-138.
Confira também: O Poder dos Mitos e Metáforas para Criar o Futuro
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